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Olhares: Projeto de Vida é tema central do novo ensino médio

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Texto, Uni7 Informa

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A competência será desenvolvida em todas as escolas a partir da nova grade curricular para auxiliar no futuro dos alunos

Sala de aula vazia em escola municipal de Fortaleza

Foto: José Leomar / Diário do Nordeste

Em 16 de fevereiro de 2017, a Lei nº 13.415 sancionada pelo Governo Federal provocou mudanças na já existente Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). Com essa legislação, a infraestrutura do ensino médio nas escolas do território nacional será alterada em diversos aspectos, com previsão de efetivação para o ano de 2022. Na lei, o tempo mínimo do estudante na escola foi ampliado de 800 horas para 1.000 horas anuais, e foi definida uma nova organização dos conteúdos estudados para que contemplem uma Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Além disso, haverá também a oferta de diferentes disciplinas com foco nas áreas de conhecimento, e nas preferências de formação técnica e profissional de cada aluno. 

Os itinerários formativos são o conjunto de disciplinas que os estudantes poderão escolher no ensino médio. Os alunos poderão se aprofundar em uma ou mais áreas do conhecimento, como Matemática, Ciências Humanas e Linguagens e Códigos, além da Formação Técnica e Profissional (FTP). As redes de ensino terão autonomia para definir quais itinerários formativos irão ofertar, considerando um processo que envolva a participação de toda a comunidade escolar. A mudança do sistema de ensino tem como objetivo aproximar as escolas à realidade dos estudantes, considerando as novas demandas e complexidades do mundo do trabalho e da vida em sociedade. 

O novo sistema inclui o Projeto de Vida, uma competência essencial que oferecerá para os alunos, dentro das instituições de ensino, experiências que auxiliem em sua orientação vocacional. Dessa forma, os estudantes constroem sua própria grade curricular de acordo com suas preferências, sendo essa uma estratégia de reflexão sobre sua trajetória escolar, pessoal, cidadã e profissional. O Projeto de Vida permitirá que o jovem opte por uma formação profissional e técnica dentro da carga horária do ensino médio regular. Assim, ao final dos três anos de curso, o jovem será auxiliado a decidir o seu futuro, um problema que muitos recém formados enfrentam no país.

O Projeto de Vida é uma unidade, um espaço dentro da arquitetura curricular da escola em que um professor capacitado, com material e aulas estruturadas e organizadas orientará os alunos a ter uma visão do futuro definida, direcionada”, afirma Iane Terceiro Nobre, Coordenadora de Gestão Pedagógica do Ensino Médio – COGEM

Segundo Iane, o projeto já está em execução no Ceará desde o ano de 2008, quando as escolas de ensino profissional foram iniciadas. A coordenadora apontou ainda que, a partir de 2022, a mudança passa a ser implementada de forma progressiva. A princípio essa alteração ocorrerá apenas para os estudantes da primeira série do ensino médio, e nos anos seguintes para as demais séries.

A IMPORTÂNCIA DO PROJETO

A Psicoterapeuta e Neuropsicóloga, Ayla Andrade, que trabalha também com crianças e adolescentes, explica o que é a orientação vocacional: é um processo realizado com o paciente de autoconhecimento, buscando características de personalidade e como elas se adequam às profissões. A gente realiza o inventário de interesse, que as pessoas chamam de teste, para ver os aspectos de personalidade e encaixá-los com os interesses, para então elucidar qual a profissão adequada e de maior afinidade do paciente”.

O acompanhamento vocacional é muito importante na formação do jovem como cidadão em diversos aspectos, indo inclusive além de aspectos meramente profissionais, e por isso é essencial sua implementação nas escolas, como esclarece Ayla: “Muitas vezes as pessoas entram na universidade e começam a cursar uma graduação que lá na frente descobrem que não tem nada a ver com seu jeito de ser, com suas características e seus interesses. O acompanhamento ajuda também no autoconhecimento, a esclarecer conflitos internos em relação ao social, ao profissional e a vida”.

O acompanhamento ajuda também no autoconhecimento, a esclarecer conflitos internos em relação ao social, ao profissional e a vida

Ayla Andrade

A PREPARAÇÃO DAS ESCOLAS

O sucesso do Novo Ensino Médio depende de mudanças na formação de professores. Diante das modificações, os agentes escolares devem se esforçar para se aprofundar no assunto e se adequar o quanto antes, para oferecer um processo de ensino e aprendizagem condizente com as transformações do sistema. Dentre as mudanças, existe um impacto na formação dos professores, que segundo Iane Nobre, não será algo automático, e levará um tempo para que os docentes se adequem a essa nova forma de organização.

Iane Nobre explica que a Base Nacional Comum para Formação de Professores foi elaborada a luz da BNCC, e possui uma proposta de organização com foco na aprendizagem, mas que também vai além disso, abordando o desenvolvimento de competências que possam auxiliar o aluno na complexidade e organização da sua vida fora da escola. “Essa adequação é processual, a gente está tendo um curso com mais de 44 mil professores e gestores da rede para essa formação ser replicada no espaço de cada uma das unidades escolares”, afirma Iane.

Outra questão frequente sobre a Reforma do Ensino Médio é a preocupação se as escolas possuem uma infraestrutura adequada para as mudanças. Para a coordenadora de gestão pedagógica, a estrutura das escolas vem sendo melhorada ano a ano, com investimentos em melhorias, além de um estudo onde será necessário mais recursos para que todas as instituições estejam minimamente adaptadas para esse início de implementação, tendo em vista todo o processo gradual.

DESIGUALDADE

Há uma tensão permanente sobre o novo modelo de ensino, em que se discute se ele irá gerar desigualdades educacionais. De acordo com a educadora, é preciso haver a experiência para poder de fato julgar se essa mudança vai impactar e gerar uma desarmonia. “Previamente, a gente imagina que, na verdade, deveria diminuir a desigualdade, porque hoje em dia a escola particular faz de um jeito, a pública de outro, e a que tem tempo integral de outro. Todas vão precisar fazer a mesma arquitetura, então é provável que essa harmonização gere menos desigualdade do que temos hoje, mas precisamos ver como de fato todas as redes vão se organizar. Ela foi pensada para ter uma parte da carga horária que é comum para todo mundo e uma parte de aprofundamento a partir da escolha do estudante”, ressalta a gestora.

Segundo o relatório Education at a Glance (Educação em Resumo), publicado em 2018 pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), apenas 9% dos estudantes do ensino médio no Brasil estavam matriculados em programas vocacionais, enquanto em países desenvolvidos como França e Portugal a média é de 41%. 

Diante disso, a implementação da orientação dentro do sistema educacional público pode aumentar o número de jovens auxiliados. Ayla esclarece as dificuldades percebidas nos jovens durante esse processo: “Muitos deles não têm a oportunidade de fazer a orientação vocacional. Além disso, em alguns casos há influência dos pais em querer uma profissão específica para o filho e ele ser contrário a ela, então isso pesa muito de forma negativa. Vejo também hoje os jovens muito perdidos, sem saber o que querem, ainda muito imaturos para escolher a profissão, então estamos aqui para trabalhar num processo de mudança que os ajude e facilite a chegar na escolha da profissão de forma mais madura e tranquila”. 

PAPEL DAS ESCOLAS

Outro ponto reforçado por Iane é o papel das escolas nesse Novo Ensino Médio. Ela destaca que os alunos precisam ter mentoria para os orientar nesse caminho a ser traçado. “Nessa idade em que eles estão, a maioria deles, adolescentes, é muito complicado não se ver como criança e nem ser um adulto e a pressão que eles sofrem de terem que tomar decisões e pensar nesse futuro gera muita insegurança. E ter adultos por perto, comprometidos em dar apoio, em estabelecer uma visão de futuro que seja segura, que possa fazer com que se sintam apoiados nesse trajeto, é o que a gente tem visto que a escola está fazendo e faz diferença na vida deles”, declara a educadora.

         

Foto: Citânia Consultoria

Na visão de Ayla, as instituições de ensino possuem um papel fundamental no processo de educação das pessoas: “Eu costumo dizer que a escola é a segunda casa, um local que se educa, que o adolescente e a criança passam mais de 50% do dia lidando com adultos que vão também influenciar no seu pensamento, na forma de ser e na educação do jovem, então tem um peso muito grande a forma como essas pessoas vão se relacionar”. Entretanto, a psicóloga pontua sobre a importância da colaboração entre família e escola nesse processo: “A escola tem o papel de educar, mas esse papel deve ser compartilhado com os pais, de forma que comungue com a forma de ser, com o pensamento e com o que eles acreditam, para fazer esse trabalho juntos”.

Um acordo entre o Governo Federal e o Banco Mundial foi assinado em 24 de maio de 2018 e tem vigência de até 2023. Por meio dele, foram destinados US$221 milhões (aproximadamente R$1,249 bilhão) para programas e ações do Plano Plurianual previamente selecionados e acordados, relacionados ao ensino médio. Desta forma, foram definidos indicadores vinculados a desembolsos relacionados aos objetivos do programa, condicionados ao cumprimento de metas. 

Segundo o Ministério da Educação (MEC), o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) terá novo modelo construído para seguir as mudanças do ensino médio. Seguindo a BNCC, no 1º dia as avaliações teriam questões mais gerais. Já no 2º dia, as disciplinas seriam específicas, baseadas nos roteiros formativos incluídos na Reforma do ensino médio. Os inscritos no exame fariam provas de acordo com a área de interesse ao curso superior que eles pretendiam seguir. O Novo Enem ocorrerá de maneira gradual ao longo dos anos para que, em 2024, a aplicação do exame seja realizada conforme as diretrizes da mudança no sistema.

Texto: João Pedro Pacheco Artuzo e Maria Gleiciane Soares Leandro

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