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NOVOSEIXOS: Lucia Santaella ressalta a semiótica e critica a educação no Brasil

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Uni7 Informa

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(Foto: Rafael Cunha/BOLT)

(Foto: Rafael Cunha/BOLT)

Professora titular da Pontifícia Universidade Católica (PUC), Lucia Santaella esteve na Faculdade 7 de Setembro (FA7) para dois momentos. O primeiro foi o Talk: Pesquisa em Semiótica, coordenado pela aluna de jornalismo, Karol Saldanha, do 4º semestre, que também contou com a participação dos professores Aldo Marcozzi e Renata Gauche, do Jornalismo, e Fábio Delano, da Pedagogia. O segundo, a palestra de encerramento da Semana da Comunicação e Design 2016, às 19 horas, com a temática “Pós-digital – Por quê?”

Entre os dois momentos, a professora Lucia Santaella conversou com o Quinto Andar. Confira a entrevista:

Quinto Andar: Por que é importante estudar semiótica?
Lucia Santaella: Porque as linguagens e os signos estão crescendo no mundo e se diversificando. Os meios de produção de linguagem não param de proliferar. Da fotografia nós fomos para o cinema, do cinema nós fomos para a televisão, rádio. Da televisão e rádio de repente explode esse mundo digital do computador. O computador é uma metamidia, ele mistura todas as linguagens. E daqui a pouco vem aquilo que é chamado “internet das coisas”, as coisas vão começar a se comunicar entre si e conosco. Conclusão: a semiótica nos ajuda a compreender como é que a linguagem produz significado, como é que a linguagem é interpretada. Porque nós somos semioticistas natos, mas a gente fica sempre na superfície da interpretação. Então a semiótica ajuda a aprofundar e perceber detalhes que uma pessoa simplesmente intuitiva não consegue ver. Então é muito importante para a gente enxergar a realidade de uma maneira… Ou seja, não de uma maneira mais complexa, mas mais fiel à complexidade da realidade.

QA: No Brasil, a semiótica tem o alcance que deveria?
LS: Mais do que em muitos países. Os jovens no Brasil têm uma certa curiosidade pela semiótica. Eu até escrevi, faz muitos anos, um artigo que tinha o seguinte título: Brasil, um país que sintoniza com a semiótica. Porque o Brasil é uma cultura em que as linguagens se misturam muito. Por exemplo, as linguagens do corpo, as linguagens do olhar, a cultura popular que ainda tem vida no país, a maneira como o país não tem preconceitos e nostalgias e fica muito aberto para as novidades. Então o grande problema é que não existe uma profissão de semioticista. Isso dificulta que ela seja institucionalizada como uma área de conhecimento. Ela é uma visitante em outras áreas de conhecimento, porque ela é muito multidisciplinar.

(Foto: Rafael Cunha/BOLT)

(Foto: Rafael Cunha/BOLT)

QA: Com a pós-modernidade e o mundo cada vez mais imediatista, a arte é mais ou menos importante?
LS: Nunca se produziu tanta arte como agora. Enormes museus, megaexposições, exposições para vender, exposições só para expor, bienais no mundo inteiro, não é? Antes existiam poucas bienais no mundo, hoje existe bienal de Istambul, bienal de Tóquio e assim por diante. E grandes museus, olha esse Museu do Amanhã, no Rio, e outros no mundo inteiro. Então, a arte virou algo, é um valor aspiracional. Nunca tanta arte quanto agora e artes tão heterogenias. Eu dei agora, na terça-feira, uma palestra em Brasília sobre a heterogeneidade radical da arte contemporânea. O que a gente não pode é ficar cultivando nostalgias acerca de “ai, eu acho que arte é isso” e daí você vai para a bienal e impõe sobre aquilo que você vê a ideia previa que você tinha de arte. Ai você não é capaz de perceber mais nada, porque a arte sempre existiu e continuará existindo para regenerar a nossa percepção.

QA: Com o advento da tecnologia, com seus tablets e smartphones, o processo educativo está sendo dificultado ou as pessoas sempre encontraram uma forma de se dispersar?
LS: No meu livro “Comunicação Ubíqua”, eu desenvolvo uma ideia bem minha e que ficou bastante conhecida nos meios educacionais, que é a da aprendizagem ubíqua. Hoje você tem formas de aprendizagem simplesmente clicando no teu celular. Não precisa nem de um tablete. Você entra no Google, você quer saber uma informação que não tem e você vai lá e recebe essa informação imediatamente, em qualquer lugar que você estiver. Qualquer curiosidade que surja, você pode sanar com um celular na mão. É claro que isso não substitui o ensino formal, porque o ensino formal implica sistematização, porque nem tudo que você colhe como informação na internet é memorizado. Ao contrário, aquilo que a gente vai buscar na internet, na maior parte das vezes são informações que a gente não memoriza. Uma informação não memorizada, não leva ao conhecimento, porque o conhecimento é aquilo que eu interiorizo como informação para ser utilizada quando a ocasião surgir. Porque não tem separação entre o conhecimento que eu tenho na minha cabeça e a maneira como eu ajo no mundo. Se eu tenho mais conhecimento, a minha ação vai ser mais eficaz em determinadas situações.

QA: O que a senhora pensa sobre a educação no Brasil?
LS: Uma tragédia! Uma tragédia total. Basta a gente ver os resultados internacionais. 48% dos alunos que deixam as universidades brasileiras, e isso foi pesquisa séria e ninguém repete isso, são analfabetos funcionais. Não sabem ler um texto e não sabem a matemática básica. Então, como que você vai avaliar? Se não dizendo a verdade, que é uma tragédia. E mudam leis, e mudam leis e não adianta nada. Mudança de leis não resolve um problema endêmico. Aliás, é um problema que tem que começar por um diagnóstico muito sério: por que erramos tanto? E onde estamos errando? Mudar currículo, mudar a sistemática não resolve. Tá muito sério esse problema. Chegam a nível de pós-graduação com uma formação precaríssima, com problemas de redação. Não têm o domínio da língua, não conseguem estruturar um texto. Ler um texto e não entende o que leu. É isso!

QA: Vivemos um momento político conturbado. Como a senhora enxerga todo esse momento do país?
LS: Cara do Brasil! Tudo aqui é muito confuso. Agora o pior de tudo neste país… Nós somos falantes de língua indo-europeia. Vou longe, mas chego lá. As línguas indo-europeias cultivam as oposições e as dicotomias, né? Espirito e matéria, corpo e alma, forma e conteúdo etc. Nossa vida está infestada dessas oposições. Agora, quanto mais pobre é o pensamento, mais as oposições viram puro maniqueísmo. O bem no extremo e o mal no outro. Aí você adere aquilo que você acha o bem e tudo aquilo que não é igual ao que você pensa, é mal, percebe? Deus e o diabo na Terra do Sol, Glauber Rocha já diagnosticou.

QA: A senhora comentou no Talk que teve algumas de suas obras barradas em universidades federais, devido ao seu comentário sobre as ciclofaixas colocadas na gestão do ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad. Daí, pergunto: as universidades são ambientes plurais?
LS: Não! Não, são. Porque aquilo foi uma manifestação no Facebook. Eu estava irritada de noite, porque levei 45 minutos para andar quatro quarteirões, cheguei atrasada em tudo, foi atrasando… Porque vai numa cascata, se atrasa na primeira responsabilidade que tem no dia, vai atrasando e cheguei a casa 11 da noite muito irritada e escrevi aquilo, uma brincadeira! Agora, meus livros não têm nada a ver com isso, com aquilo que eu sinto no meu cotidiano. Por favor! Meus livros são obras de estudo, de pesquisa. Agora, me perseguir ideologicamente porque eu falei mal de uma ciclofaixa? Bom, agora a gente viu o que aconteceu em São Paulo, ele teve 16% dos votos. Enfim, as pessoas não ficaram contentes. Eu não sou contra ciclovias. Eu seria louca, se fosse contra! O problema é que precisa de planejamento, precisa de estudo, e não sair pintando rua feito louco. 400km de ciclovia… eu reclamei porque moro num bairro montanhoso. Não tem sentido. Mas, enfim, isso ficou no passado. O que me irrita é se você entrar no Google, você vai encontrar essa informação, que aparece como algo mais importante do que os meus livros. Isso é ridículo!

Carlos Holanda
4º semestre

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