PRIMEIRA PAUTA: Marisa e sua saudade

Marisa, em seus plenos 27 anos, é uma mulher de longos cabelos negros e olhos profundamente azuis como uma tarde de sol ensolarado. Todos os dias ela percorre aquela rua com tons cinzas, que transmitem a sensação de abandono. Levada pelos sons dos poucos carros que ali costumavam passar, ela sabe a dificuldade de caminhar novamente logo após o tormento de ter seus dias passando em uma linha de tempo lenta e angustiante como a dos últimos seis meses.

Por um breve momento, ela retorna aos seus velhos costumes e, por aquela mesma rua, consegue observar como a vida passa de forma mais intensa. Marisa consegue sentir o alívio de ter sua prisão domiciliar levada pelo vento gelado daquele dia, como um peso que é retirado das costas. Ela sabia que aquele momento era tempo de recomeços. Ao caminhar em passos lentos e longos, seus olhos não podem deixar de ver os homens e mulheres sentados na calçada de uma casa pequena, com uma parede em tom amarelo. Eles choravam a perda de seu familiar. Mesmo depois do longo período de reclusão, ainda podemos observar os rastros de dor e tormento que a pandemia deixou.

Ela lembra exatamente naquele momento o porquê daquela longa caminhada. Estava indo à casa de sua avó Raimunda, de 91 anos. Os meses se passavam e a única maneira de tentar deixar aquele distanciamento social menos doloroso foi utilizando de uma tela fria de celular para se manter presente na vida de sua avó. Foi construída uma rotina de chamadas. Marisa sabia bem o que esperava do reencontro com sua avó, carregado de calor e carinho. Mas ela sabia também que não poderia se jogar no colo de sua avó como fazia aos cinco anos de idade, pois ainda existem resquícios da doença e, para preservar o bem-estar de sua amada matriarca, deveria manter algum tipo de distância.

Texto: Victória Borges (2º semestre – Jornalismo/UNI7)