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Olhares: Malefícios do uso de agrotóxicos e a Lei Zé Maria do Tomé

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Texto, Uni7 Informa

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A aplicação de pesticidas químicos na natureza apresenta cada vez mais prejuízos para o ser humano e para o ecossistema, mostrando a necessidade de intervenções

Após casos de impactos ambientais nocivos e decorrências na saúde da população local, foi aprovada no Ceará, em 2019, a Lei Zé Maria do Tomé, que proíbe a pulverização aérea de agrotóxicos no estado. O projeto foi criado pelo deputado Renato Roseno (PSOL).

Em lugares como a Chapada do Apodi e Limoeiro do Norte, a aplicação de agroquímicos provocou diversos desastres ecossistêmicos que motivaram a criação dessa lei. Atualmente o Supremo Tribunal Federal (STF) discute a legitimação da Lei.

Aplicação intensiva de agrotóxicos nos meios de produção acarretam danos na natureza e na saúde humana.
(Foto: TV Verdes Mares/Reprodução)

Aplicação intensiva de agrotóxicos nos meios de produção acarretam danos na natureza e na saúde humana.

(Foto: TV Verdes Mares/Reprodução)

O QUE SÃO OS DEFENSIVOS AGRÍCOLAS?

Os agrotóxicos são substâncias químicas sintéticas utilizadas no meio do setor agrícola com o propósito de proteger as plantações de pragas e doenças e garantir a sua produtividade. O Ministério da Agricultura noticiou em janeiro de 2021, no Diário Oficial da União, que, em 2020, foram aprovados o uso de 493 agrotóxicos no Brasil, sendo 13 inéditos e 480 genéricos, batendo o recorde de 2019. Estudos confirmam que o emprego desses produtos químicos no meio da agricultura é causa de diversos problemas no meio ambiente e na saúde humana, visto que modifica a composição da fauna e da flora.

O primeiro agrotóxico foi fabricado em 1874 pelo químico austríaco Othmar Zeidler e chama-se Dicloro-Difenil-Tricloroetano (DDT). As suas propriedades pesticidas, no entanto, só foram descobertas em 1939, pelo químico suíço Paul Hermann Muller. A partir de então, os agrotóxicos se popularizaram globalmente quando começaram a ser utilizados como armas químicas durante a Segunda Guerra Mundial com o objetivo de matar insetos proliferadores de doenças, em especial a malária; foram usados também na Guerra do Vietnã pelos soldados americanos para desfolhar a vegetação do pais e facilitar a localização dos soldados inimigos.

O uso desses agroquímicos se proliferou no Brasil a partir da década de 1960, durante a Revolução Verde, que foi o processo de modernização das técnicas agrícolas ao redor do mundo. Desde então, essa prática se tornou extremamente imersa na agricultura brasileira. Segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), o Brasil ocupa a 7ª posição entre países que mais aplica pesticidas nas suas vegetações.

QUAL É, ENTÃO, A GRANDE PROBLEMÁTICA POR TRÁS DO USO DE AGROTOXICOS?

Vários estudos afirmam que a inserção desses produtos químicos nas práticas agrícolas é maléfica tanto para o meio ambiente como para a saúde humana.

A sua aplicação na natureza ocasiona na alteração da composição dos ecossistemas aquáticos e terrestres, provocando um desequilíbrio ecológico. O uso desses pesticidas sintéticos resulta na fragilização do solo: a atuação do agrotóxico nas terras empobrece os seus nutrientes, além de ser responsável por eliminar organismos importantes e espécies não alvo. Em Santa Catarina, 50 milhões de abelhas morreram devido ao envenenamento por uso de agrotóxicos na vegetação durante o primeiro mês de 2019.

A agropecuária também é um ramo que utiliza agrotóxicos causando danos ao meio ambiente. Com o propósito de acelerar o desmatamento e abrir espaço para a produção de soja e para a pecuária, fazendeiros realizam pulverização aérea de pesticidas químicos na Amazônia em uma área de 30 mil hectares.

Outro grande problema do uso dessas substâncias químicas são os danos que estes impõem na saúde humana. A aplicação de agrotóxicos pode disseminar prejuízos às pessoas por diferentes maneiras, como pela contaminação dos alimentos ou das águas, o contato direto dos trabalhadores ou pela pulverização aérea próxima de comunidades. Estudos científicos confirmam que a intoxicação por esses produtos químicos traz diversos efeitos negativos para o organismo do ser humano. Os efeitos vão de sintomas leves, como náuseas, irritações no corpo, dificuldades respiratórias, ou situações mais graves, como convulsões, paralisia, coma ou até doenças terminais, como câncer.

Além de desenvolver doenças que atacam o organismo, a intoxicação por agroquímicos pode desenvolver em seres humanos transtornos psicológicos, como quadros depressivos.

A CRIAÇÃO DA LEI

Apesar de todos esses prejuízos, o Brasil continua sendo o segundo maior comprador de agrotóxicos proibidos na Europa e a principal razão disso é o predomínio do agronegócio na economia. Segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA), o Produto Interno Bruto (PIB) do agronegócio no Brasil teve crescimento de 24,31% em 2020, batendo o recorde de 2019.

As consequências disso são refletidas diretamente nas fazendas onde são manuseados os pesticidas. Estudos da Universidade Federal do Ceará (UFC) relacionam a ocorrência de casos de câncer e outras doenças na população do Limoeiro do Norte com o uso de agroquímicos na região. Uma pesquisa da mesma Universidade declarou que as águas da Chapada do Apodi estão contaminadas por defensivos agrícolas extremamente tóxicos, sendo usadas para a produção de alimentos e abastecimento dos moradores do local.

Renato Roseno, deputado estadual filiado ao PSOL
(Foto: Thais Mesquita)

Por esses motivos, em 2015 o deputado estadual Renato Roseno, do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) entrou com o projeto de lei contra a pulverização aérea de agrotóxicos no Ceará, que foi aprovada em 2019. Segundo o congressista, “Pela conformação inclusive do Ceará, as comunidades estão muito próximas das fazendas, muito próximas das empresas. Existe algo chamado deriva; é quando a molécula do veneno vai pelo ar e acaba caindo para longe da plantação e ela vai contaminar rios, lagoas, poços, a casa das pessoas, os animais”. Conforme a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), cerca de 20% dessas substâncias químicas pulverizadas é dispersado para fora das áreas demarcadas para aplicação.

OUTRAS MANEIRAS DE COMBATER ESSE PROBLEMA 

O crescimento da manipulação de pesticidas sintéticos na agricultura é um fator que acaba gerando, além de prejuízos ambientais e para a saúde, prejuízos também econômicos. De acordo com um estudo feito por pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a cada dólar gasto com agrotóxicos, são gastos US$1,08 em tratamentos para pessoas intoxicadas por estas substâncias sintéticas.

O deputado Renato Roseno, autor da Lei Zé Maria do Tomé afirma que existem três maneiras de se combater o uso de agroquímicos: 

  1. É necessário tributar.

Se você for comprar aspirina na farmácia você paga imposto. Se você for comprar glifosato, que é o agrotóxico mais vendido do mundo, você não paga imposto. É absurdo você isentar, porque quando você isenta você estimula o consumo dos agrotóxicos”.

  1. O banimento dos banidos.

“Um terço dos venenos aplicados no Brasil são proibidos no restante do mundo. Por exemplo, a Bayer vende no Brasil o que ela não vende na Alemanha, onde é a matriz. Por quê? Porque lá eles têm a regulação mais forte. Então, o Brasil aplica venenos na agricultura que não são mais aplicados em outras partes”.

  1. Fazer uma transição ecológica.

“Esse modelo de grandes plantações, de monocultura, não é razoável. A humanidade conseguiu viver até a metade do século 20 praticando outras agriculturas. É necessário fazer uma transição para um modelo agrícola agroecológico, ou seja, produzir alimentos saudáveis pelas pessoas”.

A RESPOSTA DO AGRONEGÓCIO

Os objetivos de proteção ambiental e humana da Lei Zé Maria do Tomé, visando priorizar a produção de alimentos saudáveis, não têm compatibilizado com a indústria do agronegócio. Por esse motivo, a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) entrou com um pedido para impedir a constitucionalidade da legislação com uma Ação Direta da Inconstitucionalidade (ADIN). As suas intenções são, além de barrar a lei pioneira, impedir que outros estados adotem regulamentos semelhantes.

Em resposta, diversas entidades promovem mobilizações em defesa da Lei Zé Maria do Tomé, incentivando a participação popular e de outras instituições.

Zé Maria do Tomé foi um nome importante na questão da luta contra a pulverização aérea de agrotóxicos na Chapada do Apodi, no Ceará. Em 2009, o movimento liderado por ele conquistou a aprovação da lei que proibia a pulverização em Limoeiro do Norte. Em 2010, Zé Maria é assassinado e, em seguida, a lei é revogada. 
  • Conforme a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), cerca de 20% dessas substâncias químicas pulverizadas é dispersado para fora das áreas demarcadas para aplicação.

Texto: Alexia Viana

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