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O fantástico guia de Filipe

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Entrevistas, Texto

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A versatilidade é uma de suas características, e não é para menos. O editor do Guia do Sabor, caderno de gastronomia, e subeditor do Caderno 3, de cultura, ambos do jornal Diário do Nordeste, Filipe Palácio, já produziu conteúdo para os cadernos de Política, Infantil, Economia… Fez resenha de disco e escreveu até sobre rali. Especialista em Gerência Executiva de Marketing, pelo Centro de Treinamento e Desenvolvimento (Cetrede), da Universidade Federal do Ceará (UFC), Filipe bateu um papo franco com estudantes de Jornalismo Especializado I da Faculdade 7 de Setembro (Fa7) sobre cultura, rotinas de produção, experiências como jornalista e as novas tendências da profissão.

Soriel Leiros: Qual o desafio de sair de uma editoria como Cotidiano/Cidades, que trabalha mais com o factual, para trabalhar no ambiente de cultura?
Filipe Palácio: Na verdade, a questão de despertar a reflexão do leitor. Ela deve estar presente em toda editoria, inclusive, na de celebridades. Você pode escrever uma notinha sobre uma fofoca e ali você dá o seu toque pessoal no texto e leva o leitor a refletir de alguma forma sobre aquele assunto, se ele é relevante ou não. Cabe ao leitor decidir. No meu caso específico, a cultura – música, cinema, artes – já era uma coisa que eu consumia antes, só não trabalhava com isso, era meu lazer. Então, hoje, de certa forma, juntei as duas coisas. Quando estava na faculdade, almejava a editoria de cultura, era a meta. Como consumia aquilo ali, era natural no meu dia a dia, então, eu achava que ia ser muito mais bacana escrever sobre aqueles assuntos, como realmente é. Mas cada editoria, cada pauta tem o seu prazer em fazer.

Soriel: Como você enxerga, enquanto subeditor do Caderno 3, o posicionamento do veículo para tentar tornar o caderno mais acessível, digamos assim, para o grande público?
Filipe: A gente parte do pressuposto, agora falando de cadernos especializados em geral, esporte, gastronomia, que alguns termos você não precisam ser explicados, porque o leitor já foi iniciado naquele tema, naquela área. Se ele não foi iniciado, de certa forma, hoje está tão fácil você pesquisar. Ele acaba aumentando o repertório dele, o vocabulário.

Soriel: Em que momento vocês se reúnem para saber se realmente há ou não essa ideia de contemplação do leitor? Como é que vocês têm esse feedback?
Filipe: A gente não se reúne para falar disso. Tem o canal que é o e-mail do caderno, onde a gente recebe crítica, xingamento, elogio, sugestão de pauta, sempre ligado nesses comentários. A partir deles, a gente sabe o que é que dá mais audiência, o que não pode abordar, que o pessoal não gosta. Agora, é interessante perceber que a questão da contemplação, de ser contemplado, é incrível, mas a maior parte das matérias, a maior repercussão são matérias que são completamente fora do universo local.

Soriel: E como vocês fazem o filtro das sugestões e dos materiais de assessoria que recebem? Como equilibram justamente com a linha editorial do jornal?
Filipe: Isso passa por várias questões. Já aconteceu, muitas vezes, de a gente deixar de fazer uma matéria superinteressante, porque não tinha quem fizesse. Acontece muito. A equipe é pequena. Nós somos: Delano Rios (editor), Filipe Palácio (subeditor), Fábio Marques, Adriana Martins, Maiara de Araújo e Iracema Sales, repórteres.

Palácio 2Soriel: O Jornalismo Cultural vive uma crise ou o próprio jornalismo impresso vive uma crise por conta dessa questão estrutural?
Filipe: As empresas de comunicação, em geral, vivem essa crise financeira, de corte de gastos, de redução, de otimização de recursos, de fazer aquela quantidade mínima de recursos render. O Sistema Verdes Mares, em relação às outras empresas, ainda está numa situação bem confortável. Tenho certeza de que todos os repórteres de cultura, de gastronomia, de outras editorias, do Zoeira [caderno de entretenimento do Diário do Nordeste], do Turismo, que são também especializados, já têm alguma história para contar de pauta que tiveram que derrubar, ligar para o entrevistado e remarcar porque tinha essa possibilidade por conta de outras prioridades do jornal. Isso é diário, é do nosso cotidiano. A gente já marca pensando na possibilidade daquela pauta ser cancelada pela questão das prioridades.

Soriel: Como você vê o mercado cultural cearense em relação ao eixo Rio-São Paulo?
Filipe: Está crescendo o número de artistas conhecidos fora daqui, que têm espaço lá fora e são valorizados. Uma das grandes responsáveis por isso é a internet. Daniel Peixoto, da Montage; Os Selvagens à Procura da Lei; o próprio Fernando Catatau (Cidadão Instigado). Eram coisas impensáveis há cinco anos. Então, hoje, cada vez mais cearenses estão penetrando e tendo força lá fora. E são artistas que já tinham espaço aqui antes. Eles não podem negar isso nunca.

Soriel: Pela linha editorial do veículo, há sempre a possibilidade de fazer uma crítica? Muitas vezes, tenho uma crítica a ser feita, é importante para o meu leitor, mas resvala justamente na chefia, que aceita ou não permite que isso seja veiculado?
Filipe: Vocês vão esbarrar com isso sempre na carreira. Os veículos são empresas privadas e que visam o lucro. Vai ter um momento que aquela matéria vai ferir os interesses da empresa e você não vai poder fazer. Pode buscar formas de contornar, “dar uma volta” e chegar naquele assunto. Mas se o editor-geral, o dono do jornal disser que você não vai fazer, o jornal já pode estar impresso, que ele manda voltar e faz de novo.

Soriel: Qual foi a importância de ter passado primeiro por outras editorias, como a de Cidade?
Filipe: Todo jornalista deve passar pela editoria de Cidade. E deve cobrir uma chuva bem grande em Fortaleza, um alagamento, com água, no mínimo, na canela. Ele tem que ir para a rua, ele tem que ficar na rua esperando o carro durante uma hora, porque não tem carro na redação. Tem que passar por isso para poder aprender a valorizar, para entender a logística, para cobrar.

Soriel: Fala um pouquinho como começou o Guia do Sabor.
Filipe: Além dessa experiência no Diário, no jornal, fiz durante muitos anos o guia da Veja, Comer e Beber, como repórter. Tive uma experiência muito grande. Conheço muita gente na área de gastronomia, donos de restaurante. Por conta dessa identificação com a área, o editor-geral acabou me chamando para ser editor no ano passado. O Guia do Sabor, dentro da estrutura do jornal, não é considerado uma editoria independente, tanto que não temos uma equipe independente. O meu trabalho no Guia do Sabor é em conjunto com o Caderno 3. É um projeto do jornal, essencialmente comercial. Não tem um viés muito crítico, também não pode, tendo em vista que ele é comercial.

Soriel: O que falta, hoje, para o jornalismo cultural?
Filipe: Falta muita coisa para o jornalismo como um todo, para o impresso, para a TV, para o online. A gente está passando por uma fase de mudança. O jornalismo cultural precisa se reinventar, assim como a editoria de Cidade precisa se reinventar.

Soriel: Qual é a mensagem que você deixa, a partir de suas experiências, para quem vai encarar o mercado de trabalho?
Filipe: Passem pela editoria de Cidade. Não tenham medo dela. Queiram, mesmo que vocês queiram Esporte. Leia muito sobre tudo, ouçam tudo, porque é bagagem, você vai usar como referência. É preciso você vivenciar tudo até para saber o que não quer. A redação é um lugar bem rico nesse sentido. Você vive muitas coisas. Você deve estar aberto e consciente, e absorver tudo o que puder, porque tudo vai servir para a sua carreira.

Soriel Leiros
7º semestre

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